MAX GLUCKMAN

Rituais de Rebelião no Sudeste da África

O autor, em seu livro rituais de rebelião no sudeste da áfrica faz uma análise da obra de sir james frazer e desenvolve seu artigo dialogando com ela, porém vai se distanciando, no decorrer do processo para apresentar os resultados de sua própria pesquisa.    
Partindo do trecho inicial de o Ramo Dourado, em que Frazer descreve o ritual do Rei-Sacerdote do Bosque de Nemi, na Itália (para conquistar o sacerdócio, o candidato deve assassinar o atual ocupante do posto, e neste posto permanecerá até que alguém o mate e torne-se o novo sacerdote) e o relaciona com outros rituais de rebelião registrados em vários lugares e épocas, considerando-as, em síntese, como cerimônias que representavam a morte e o renascimento da vida, especialmente a vegetal, como as colheitas anuais.
Gluckman elogia mas procura se afastar do método intelectualista de Frazer, por considerá-la como produto de uma época em que os dados a disposição do pesquisador permitiam apenas a busca de padrões intelectuais em costumes espalhados no tempo e no espaço, ao contrário da Antropologia moderna, que com o trabalho de campo, levou a pesquisa antropológica ao estudo das relações internas da própria sociedade estudada. Assim, Gluckman diz que vai tratar especificamente de cerimônias realizadas por povos do sudeste da África, nos quais ele afirma existir elementos de tensão social controlada, que ele chama de rituais de rebelião.
O primeiro deles, o rito em homenagem à Deusa Nonkubuulwana, única divindade plenamente desenvolvida do panteão Zulu. Nonkubulwana, é entendida apenas como parte humana, sendo também composta por outros elementos da natureza, tais como a neblina, as árvores e as montanhas. É a deusa que ensinou à humanidade todas as artes úteis da agricultura e da manufatura, sendo celebrada em comunidades agrícolas, em escala local, quando as lavouras começam a crescer. É um ritual de participação exclusiva das mulheres, com o objetivo de assegurar a prosperidade e produtividade da lavoura.
Gluckan menciona rituais semelhantes registrados por Frazer, destacando seu interesse pelo aspecto que nomeia como bacântico – o fato de as mulheres terem um papel dominante e os homens, subordinado, na cerimônia, sendo as sociedades em que estas ocorriam, predominantemente, patriarcais. O ritual de Nonkubulwana constitui, portanto, como conclui Gluckman: meu primeiro exemplo de um ritual de rebelião, protesto institucionalizado exigido pela tradição sagrada, aparentemente contra a ordem estabelecida, mas que pretende abençoar tal ordem, com o fito de conseguir prosperidade. (p. 6)
Mais que serem patriarcais, em tais sociedades as mulheres dependiam completamente dos homens. Gluckman cita como exemplos disso o casamento zulu, em que as mulheres se deslocavam de sua família para uma nova (a do noivo), e todo um sistema de compensação por meio de cabeças de gado era posto em funcionamento (o gado que a família da noiva recebia pelo casamento desta era usado como compensação para o casamento de seu irmão) fazia com que as mulheres, por serem forasteiras na linhagem dos maridos, fossem mais suscetíveis à acusações de bruxaria, e também porque da estabilidade do casamento delas dependia a estabilidade do casamento do irmão, acabavam presas na estrutura familiar.
O autor diz que os rituais de rebelião só vão ocorrer onde a ordem social estabelecida e suas instituições não são questionadas. Nas disputas pelo poder, aqueles que desafiavam a autoridade pretendiam tomar o lugar desta, e não modificar as regras do jogo. Essas regras do jogo – a ordem social – é tida como algo certo, a “verdade”, às vezes num nível sagrado: a ordem social é a estrutura inerente da criação. E é essa forma de ver a sociedade, segundo Gluckman, que permite a existência de rituais de rebelião, que, ao contrário do que possa parecer, mais servia para destacar a coesão social do que para mostrar alguma eventual fragilidade dela.
Concluindo, com Rituais de Rebelião no Sudeste da África, Gluckman insere a ideia de conflito como algo constituinte da própria estrutura social, e que nas sociedades apresentadas os rituais de rebelião agem tanto como uma celebração da ordem quanto como uma válvula de escape das tensões sociais, ou seja, antes como mecanismos de manutenção que como ingredientes das revoluções. 



Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

RUTH BENEDICT